Um espectro ronda a Turquia, e se chama genocídio armênio.
Em 1915, o então Império Otomano estava envolvido na I Guerra Mundial, ao lado da Alemanha e Áustria-Hungria. Um de seus muitos problemas: os russos ao norte. Surgiram dúvidas quanto à lealdade dos armênios, uma etnia cristã dividida entre os dois lados da fronteira otomano-russa. O governo otomano expediu ordens para a deportação dos armênios para longe da fronteira.
Aqui, as opiniões se dividem. O que os armênios, e a maior parte dos historiadores, diz a respeito é que as "deportações" eram apenas uma máscara para uma política oficial de extermínio sistemático, provocando a morte de cerca de 1,5 milhão de armênios.
Pela versão turca, praticamente só aceita pelos próprios turcos, realmente muitos armênios morreram, assim como muitos turcos, árabes e praticamente todos os povos existentes no império, em decorrência da situação difícil que o mesmo enfrentava. As mortes poderiam ser uma tragédia, mas não seriam um genocídio por não serem deliberadas.
A Turquia, além de não reconhecer a existência de um genocídio, criminaliza qualquer afirmação nesse sentido como um crime contra a "turquicidade".
Nesta semana, a França fez o oposto: criminalizou a negação do genocídio. Desnecessário dizer que o governo turco não ficou feliz com a nova lei francesa e ameaça com retaliações diplomáticas.
O genocídio armênio não é o único a ganhar essa "proteção especial" dos franceses, que também criminalizam a negação do holocausto judeu.
Embora os franceses estejam com a verdade dos fatos a seu lado, não sou particularmente a favor de usar a lei para silenciar a discussão, por parte de qualquer dos lados. Mesmo porque a lista de possíveis genocídios que poderiam ser reconhecidos sob pena de cadeia poderia ir muito longe. Um senador francês que votou contra a lei, Jacques Mézard, tem uma argumentação interessante (traduzida desta reportagem):
"Ela [a lei] põe em questão a pesquisa histórica e científica. Amanhã haverá a questão de um genocídio da Vendeia?", perguntou ele, referindo-se a uma revolta contra o governo revolucionário francês em 1793. "Vamos colocar a ferros os espanhóis e os Estados Unidos pelo massacre de nativos americanos? Devemos rejeitar esse texto e deixá-lo para os livros de história".
Nada a dizer sobre o Brasil, senador Mézard?
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