janeiro 17, 2011

12. Significância, insignificância (ou: a ascensão de Tutankhamon)

Em uma das minhas tirinhas preferidas de Hagar, o Horrível, ele e seu assistente Eddie Sortudo encontram um monumento à la Stonehenge. Eddie pergunta o que é aquilo, e Hagar explica que foi construído por um grande rei do passado, que mobilizou milhares de pessoas por anos para erguer o monumento e imortalizar seu nome. "Quem foi ele?", pergunta Eddie, e Hagar responde: "Ninguém sabe".

Não é uma boa explicação das origens de Stonehenge, da mesma maneira que Hagar não é uma boa representação de um legítimo viking, mas nem por isso é menos válida a reflexão sobre a transitoriedade das coisas humanas: quantas pessoas reais não foram como o rei de que Hagar fala, grandes e poderosos em vida e completamente esquecidos depois?

A resposta, claro, é: ninguém sabe.

Mas, o mundo sendo como é, às vezes também acontece o contrário: pessoas sem grandes realizações ou feitos memoráveis em vida atingem uma certa notoriedade tempos depois. Um dos exemplos mais conhecidos, para os historiadores, é o de Menocchio: um moleiro italiano do século 16 com crenças extremamente heréticas - Deus era o mais sábio dos anjos que criaram o mundo da mesma forma que os vermes criam um queijo, e por aí vai - e uma certa compulsão por anunciá-las para quem quisesse - ou não - ouvir, o que fez com que a Inquisição romana se interessasse por ele. Depois de ser solto com uma advertência em seu primeiro julgamento, Menocchio insistiu em continuar falando publicamente sobre suas crenças, e da segunda vez os inquisidores não foram tão bonzinhos.

Em vida, Menocchio não foi um personagem de grande destaque, mas tornou-se conhecido mundialmente quando o historiador italiano Carlo Ginzburg estudou os registros inquisitoriais do seu caso e fez uma análise de como um moleiro do interior da Itália poderia ter desenvolvido as crenças peculiares de Menocchio, análise que consta em seu livro O queijo e os vermes. Fica a sugestão para quem quiser conhecer um pouco da cultura daquela época, desde as leituras a que Menocchio teve acesso até o que significava cair nas mãos dos inquisidores (o fato de ele só ter sido morto ao reincidir na heresia, por exemplo, deveria ajudar a mostrar que a Inquisição não causou os banhos de sangue que as pessoas costumam imaginar).

Um segundo exemplo pode parecer mais estranho à primeira vista: o faraó Tutankhamon, governante do Egito por dez anos, no final do século 14 a.C. (aproximadamente de -1333 a -1323 - as datas do Egito antigo e outras civilizações contemporâneas estão sujeitas a uma certa incerteza, que aumenta quanto mais retrocedemos no tempo). Alguém poderia perguntar como um faraó poderia ter sido insignificante - governar um país já não é um atestado de relevância? Não nesse caso. Esqueça por um momento a popularidade imensa de Tutankhamon hoje em dia e considere o seguinte: ele subiu ao trono com nove anos. Reinou por mais dez, ou seja, morreu aos dezenove. O Egito estava em crise desde o reinado anterior, do reformador religioso Akhenaton, que costuma ser lembrado por seu monoteísmo, cuja extensão é discutida ainda hoje, e não por ter negligenciado outros aspectos do governo, como a diplomacia ou a economia. Então, ninguém esperava que coubesse a um faraó adolescente a responsabilidade de tirar o país da crise, e o verdadeiro poder estava nas mãos de seus conselheiros, como o general Horemheb, seu sucessor no trono.

Por critérios objetivos, Tutankhamon não teve tempo de se mostrar como um governante bom ou ruim, e seu nome tinha tudo para ficar esquecido nas listas de faraós entre as reformas religiosas malogradas de Akhenaton e o esplendor imperial do governo de Ramsés II, algumas décadas mais tarde. Por muito tempo, realmente foi mais ou menos isso que aconteceu. O ano da virada de Tutankhamon foi até bem recente: 1922, quando o arqueólogo Howard Carter teve a sorte imensa de encontrar uma tumba no Vale dos Reis que, ao contrário de todas as outras já achadas, estava praticamente intacta, com a maior parte de seus tesouros tendo escapado aos saques que já se faziam nos túmulos egípcios desde a antiguidade. O ocupante da tumba e seus tesouros tornaram-se mundialmente conhecidos com a descoberta de Carter, e sua máscara mortuária hoje é tão associada com o antigo Egito quanto as pirâmides ou a Esfinge.

Uma tumba bem escondida e cheia de tesouros: eis o segredo da imortalidade de Tutankhamon.

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