março 14, 2012

59. Alugando escravos no Brasil Império

O Brasil oitocentista não está na lista de assuntos que estudo no momento, então foi por pura curiosidade que comprei em um sebo um livro com anúncios de jornais do período.
A maior parte do conteúdo, apesar de interessante, era de se esperar: anúncios de escravos fugidos, compra e venda de escravos, avisos de missas, anúncios de lojas, bugigangas da Índia (no começo do século) e da Europa (mais tarde), etc.
Mas o livro valeu seu preço modesto por um dado surpreendente (ao menos para mim): existia, no Brasil Império, uma prática forte de aluguel de escravos. Algo assim (com a grafia modernizada):

Precisa-se alugar um preto ou preta que saiba cozinhar e o mais arranjo de uma casa de família; na rua das Flores número 13. - O 19 de dezembro (PR), 8/4/1854

Alugam-se uma negrinha de 14 anos, duas pretas perfeitas cozinheiras, lavadeiras e engomadeiras de roupa de senhora; informa-se por favor, à rua Luiz de Camões n. 14, antiga da Lampadosa, venda. - Jornal do Comércio (RJ), 1/10/1881

Aluga-se uma escrava crioula, sabendo lavar, engomar e cozinhar; sem vícios e fiel: quem a pretender dirija-se à rua do Alecrim, segunda casa do canto ao lado do sr. Cidade, que achará com quem tratar. - O Novo Íris (SC), 19/7/1850

Fica a dúvida, que alguém já deve ter estudado: como essa prática se inseria na economia? Havia gente que comprava escravos apenas para alugar ou era algo feito por proprietários que estivessem com mão de obra demais e dinheiro faltando?
E a constatação mais óbvia: esse tipo de coisa acontecia há apenas 130 anos atrás. Hoje seria impensável, e mesmo na década de 1880 já havia abolicionistas se opondo à escravidão, mas essa instituição ainda era aceita  o suficiente para que as pessoas pudessem colocar anúncios desses nos jornais com a maior naturalidade.
Não sou daqueles que acreditam na evolução moral da humanidade. Quase sempre, olhar do passado ao presente e ver os costumes ficarem cada vez mais parecidos com os nossos, até culminar em nós do presente, e achar que isso significa que algo melhorou, é o cúmulo dos horizontes estreitos. Mas anunciar aluguel de escravos é algo que definitivamente não faz falta...

Aos interessados, o livro é E os preços eram commodos - anúncios de jornais brasileiros do século XIX, volume 2, organizado por Marymarcia Guedes e Rosane de Andrade Berlinck.

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