agosto 26, 2011

38. Mudanças no quadro religioso - um adendo

Um texto para ajudar a pensar essas transformações religiosas brasileiras é este artigo de Marcelo Camurça da UFJF: http://www.revistasusp.sibi.usp.br/pdf/revusp/n81/15.pdf

Essencialmente, até há poucas décadas a religiosidade brasileira foi marcada pela pluralidade religiosa e unidade institucional: quase todos se diziam católicos mas não excluíam o sincretismo nas crenças e a prática ocasional de outras religiões, como o kardecismo e as religiões afro. O que se vê recentemente é o surgimento de uma pluralidade de instituições - mais igrejas reivindicando a afiliação e identidade dos fiéis e competindo entre si.

Como resultado da competição, praticamente todos os grupos anteriormente estabelecidos têm se modificado (p. 179):

Dessa forma, alterações substantivas ocorrem no campo religioso, como por exemplo: no campo evangélico, o fato de as igrejas evangélicas clássicas modificarem-se litúrgica e doutrinariamente na direção (neo)pentecostal, para ficarem mais competitivas em relação aos neopentecostalismos; no campo católico, o papel da Renovação Carismática Católica buscando dar à Igreja mais visibilidade na esfera pública, através de técnicas emocionais, lúdicas e midiáticas, muito próximas dos pentecostais, adestrando a instituição a competir no mercado religioso, na conquista e preservação dos seus fiéis (Oro, 1996; Carranza, 1998; Machado, 1996; Prandi, 1997); no campo afro, o “abandono da ideia de ‘religião étnica’ e transformação do candomblé em religião universal, dessincretização (Prandi, 1991; Silva, 1995), tentativa de sua ‘purificação’ e ‘restauração’ na sua pureza, liberado de qualquer contaminação ‘católica’” (Sanchis, 1997, p. 108).

Por outro lado, o pentecostalismo, o recém-chegado que foi o principal responsável pelo estabelecimento da competição, também não permaneceu o mesmo, sofrendo a influência do tradicional sincretismo local (p. 180):

A capacidade mimética das igrejas neo-pentecostais, como a Igreja Universal do Reino de Deus, de conciliar um discurso exclusivista e intolerante em relação às outras religiões (catolicismo, espiritismo e afro-brasileiras) e ao mesmo tempo incorporar dimensões fundamentais dessas religiões à sua estrutura tem levado ao assombro os próprios evangélicos e pentecostais ditos históricos, como expressa esse manifesto da Associação Evangélica Brasileira (AEVB), ao discordar das “práticas
da Igreja Universal do Reino de Deus que apresentam elementos radicalmente contrários à fé evangélica e à melhor herança bíblica da Igreja Protestante e Pentecostal”. Em seguida listam essas práticas – que segundo eles destoam da orientação evangélica/pentecostal – e que são, na verdade, provenientes e características ora do catolicismo, ora do kardecismo, ora dos cultos afro-brasileiros:


“– A compra de indulgências (prática do catolicismo medieval), ou seja, a compra de sucesso através das intermináveis correntes da prosperidade que demandam do fiel que doe dinheiro em cada culto sob pena de não alcançar a bênção.
 

– A aceitação das nomenclaturas e identidades dos espíritos dos cultos afro-ameríndios (exemplo: pretos velhos, exus, pombas giras, etc.) como sendo entidades por aqueles cultos afirmadas. Os evangélicos creem na existência de tais espíritos, mas não reconhecem sua designação como sendo as dadas pelos cultos afro-ameríndios, ou seja, espíritos humanos desencarnados ou deuses primitivos, mas discerne-os, antes de tudo, como espíritos malignos ou demônios, conforme o Novo Testamento.
 

– O uso de elementos mágicos dos cultos e superstições populares do Brasil, entre eles, o sal grosso (para afastar maus espíritos), a rosa ungida (usada nos despachos e oferendas a Iemanjá), a água fluidificada (usada pelos credos espiritualistas a fim de trazer a imanência espiritual para o corpo humano), fitas e pulseiras especiais (semelhantes na sua designação às fitas do chamado Senhor do Bonfim), o ramo de arruda (usado para afastar coisas más) e uma quantidade enorme de apetrechos aos quais empresta supostos poderes espirituais que podem ser passados para seus usuários” (Vinde, 1996).

De resto, leia o artigo. Pensar faz bem, e esses são assuntos que afetam nosso dia-a-dia.

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