agosto 31, 2011

39. Congresso Internacional de História Regional

Daqui a um mês - 28 a 30 de setembro - a UPF realizará o I Congresso Internacional de História Regional. Estarei lá, apresentando um artigo sobre um desses temas que descobri com a dissertação mas ficaram de fora da investigação principal. Eis o resumo:

Carisma comprometido: Desventuras de um curandeiro e sua clientela (Fontoura Xavier, 1966)
O artigo 284 do Código Penal brasileiro, que versa sobre o curandeirismo, costuma ser tratado pela historiografia como uma forma de criminalizar práticas religiosas consideradas ilegítimas pelas autoridades, bem como de fortalecer o monopólio das artes da cura por parte dos médicos. No entanto, o curandeiro corria ainda um terceiro risco ao praticar seu ofício: perder o apoio da comunidade à qual atendia. Este estudo busca analisar essa terceira possibilidade através de um estudo de caso, empregando como fonte o processo-crime em que foi réu Lúcio Rodrigues, curandeiro atuante no interior do município de Fontoura Xavier em meados da década de 1960. Rodrigues enfrentou problemas legais não por perseguição das autoridades, mas ao comprometer sua reputação junto à comunidade, tendo sido acusado de seduzir a filha de seu anfitrião, alegando que, como “servo de Deus” que era, ele precisava de uma profetisa.


Quem puder, apareça - o seminário promete ser interessante. Quem não puder terá a chance de ler os anais do evento no site.

agosto 26, 2011

38. Mudanças no quadro religioso - um adendo

Um texto para ajudar a pensar essas transformações religiosas brasileiras é este artigo de Marcelo Camurça da UFJF: http://www.revistasusp.sibi.usp.br/pdf/revusp/n81/15.pdf

Essencialmente, até há poucas décadas a religiosidade brasileira foi marcada pela pluralidade religiosa e unidade institucional: quase todos se diziam católicos mas não excluíam o sincretismo nas crenças e a prática ocasional de outras religiões, como o kardecismo e as religiões afro. O que se vê recentemente é o surgimento de uma pluralidade de instituições - mais igrejas reivindicando a afiliação e identidade dos fiéis e competindo entre si.

Como resultado da competição, praticamente todos os grupos anteriormente estabelecidos têm se modificado (p. 179):

Dessa forma, alterações substantivas ocorrem no campo religioso, como por exemplo: no campo evangélico, o fato de as igrejas evangélicas clássicas modificarem-se litúrgica e doutrinariamente na direção (neo)pentecostal, para ficarem mais competitivas em relação aos neopentecostalismos; no campo católico, o papel da Renovação Carismática Católica buscando dar à Igreja mais visibilidade na esfera pública, através de técnicas emocionais, lúdicas e midiáticas, muito próximas dos pentecostais, adestrando a instituição a competir no mercado religioso, na conquista e preservação dos seus fiéis (Oro, 1996; Carranza, 1998; Machado, 1996; Prandi, 1997); no campo afro, o “abandono da ideia de ‘religião étnica’ e transformação do candomblé em religião universal, dessincretização (Prandi, 1991; Silva, 1995), tentativa de sua ‘purificação’ e ‘restauração’ na sua pureza, liberado de qualquer contaminação ‘católica’” (Sanchis, 1997, p. 108).

Por outro lado, o pentecostalismo, o recém-chegado que foi o principal responsável pelo estabelecimento da competição, também não permaneceu o mesmo, sofrendo a influência do tradicional sincretismo local (p. 180):

A capacidade mimética das igrejas neo-pentecostais, como a Igreja Universal do Reino de Deus, de conciliar um discurso exclusivista e intolerante em relação às outras religiões (catolicismo, espiritismo e afro-brasileiras) e ao mesmo tempo incorporar dimensões fundamentais dessas religiões à sua estrutura tem levado ao assombro os próprios evangélicos e pentecostais ditos históricos, como expressa esse manifesto da Associação Evangélica Brasileira (AEVB), ao discordar das “práticas
da Igreja Universal do Reino de Deus que apresentam elementos radicalmente contrários à fé evangélica e à melhor herança bíblica da Igreja Protestante e Pentecostal”. Em seguida listam essas práticas – que segundo eles destoam da orientação evangélica/pentecostal – e que são, na verdade, provenientes e características ora do catolicismo, ora do kardecismo, ora dos cultos afro-brasileiros:


“– A compra de indulgências (prática do catolicismo medieval), ou seja, a compra de sucesso através das intermináveis correntes da prosperidade que demandam do fiel que doe dinheiro em cada culto sob pena de não alcançar a bênção.
 

– A aceitação das nomenclaturas e identidades dos espíritos dos cultos afro-ameríndios (exemplo: pretos velhos, exus, pombas giras, etc.) como sendo entidades por aqueles cultos afirmadas. Os evangélicos creem na existência de tais espíritos, mas não reconhecem sua designação como sendo as dadas pelos cultos afro-ameríndios, ou seja, espíritos humanos desencarnados ou deuses primitivos, mas discerne-os, antes de tudo, como espíritos malignos ou demônios, conforme o Novo Testamento.
 

– O uso de elementos mágicos dos cultos e superstições populares do Brasil, entre eles, o sal grosso (para afastar maus espíritos), a rosa ungida (usada nos despachos e oferendas a Iemanjá), a água fluidificada (usada pelos credos espiritualistas a fim de trazer a imanência espiritual para o corpo humano), fitas e pulseiras especiais (semelhantes na sua designação às fitas do chamado Senhor do Bonfim), o ramo de arruda (usado para afastar coisas más) e uma quantidade enorme de apetrechos aos quais empresta supostos poderes espirituais que podem ser passados para seus usuários” (Vinde, 1996).

De resto, leia o artigo. Pensar faz bem, e esses são assuntos que afetam nosso dia-a-dia.

37. Mudanças no quadro religioso brasileiro

A essa altura, a mídia já espalhou aos quatro ventos o estudo da FGV sobre a religiosidade brasileira. Infelizmente, o foco deu-se sobre apenas um punhado de dados, inclusive o mais midiático, a queda dos católicos para 68,43% da população.

O texto divulgado pela FGV contém várias outras informações que merecem ser consideradas (e também a afirmação meio estranha de que os PIIGS, incluindo a Grécia ortodoxa, são essencialmente católicos). Eis as que me chamaram a atenção:
- o declínio do catolicismo ocorreu em todas as faixas etárias, não apenas entre os mais jovens;
- ele é um fenômeno acelerado, não gradual, tendo ocorrido principalmente nos últimos 30 anos: ainda em 1980, os católicos eram 88,96%;
- em dois estados os católicos já não são maioria: Rio de Janeiro e Roraima;
- o maior crescimento ocorreu entre os evangélicos tradicionais, de 5,35% para 7,47%;
- os homens são os menos religiosos, mas também os mais católicos; mulheres formam a maior parte dos evangélicos e espíritas;
- evangélicos tradicionais e espíritas concentram-se nas classes altas. Evangélicos pentecostais, nas baixas. Católicos e não religiosos são mais comuns nos dois extremos.

O que parece evidente é que a religião está num momento de mudanças rápidas por aqui. As duas grandes perguntas sem resposta são: a) quando e em que ponto vai parar a fuga dos católicos? O catolicismo continuará sendo majoritário por muito tempo ou se tornará apenas a crença mais comum? b) Quais serão as mudanças sociais e culturais decorrentes desse cenário mais plural? Mais tolerância ou igrejas agressivamente caçando fiéis e atacando suas rivais?
A resposta à primeira pergunta depende, em grande parte, de quais atitudes o clero católico pretende tomar para recuperar o rebanho perdido - não é uma que outra vinda do papa que vai fazer a diferença. A segunda depende principalmente dos pentecostais, que no momento formam a principal nota dissonante num contexto mais ou menos tolerante (ênfase no mais ou menos, por favor). Por mim, apenas gostaria que eles abandonassem a sua peculiar obsessão à la americana com a verdade literal da Bíblia e o obscurantismo científico que daí segue. Atualmente, existe um motivo para que o pentecostalismo seja inversamente proporcional ao grau de instrução das pessoas...

agosto 12, 2011

36. Fuga de Sobibor

Está para ser lançado um livro traduzido pelo colega Felipe Abal, Fuga de Sobibor. Fica a sugestão para os entusiastas pela Segunda Guerra, e aqui vai o anúncio do lançamento:

Editora 8INVERSO lança no Brasil obra inédita sobre a Segunda Guerra Mundial
“Fuga de Sobibor”, de Richard Rashke, é resultado de extensa pesquisa histórica sobre evento da Grande Guerra ainda pouco conhecido pelos brasileiros
A Editora 8INVERSO lança “Fuga de Sobibor”, do norte-americano Richard Rashke, em dois eventos, no dia 26 de agosto, em Passo Fundo, Rio Grande do Sul. O primeiro, às 15h, no Centro de Lazer e Cultura Popular, no Campus I da Universidade de Passo Fundo, será uma sessão de autógrafos com a presença do tradutor da obra, Felipe Cittolin Abal, e da Editora 8INVERSO, em programação paralela à 14ª Jornada Literária de Passo Fundo. Também no dia 26, das 18h às 20h, Abal autografa na Ramires – Revisteria e Livraria, Avenida Brasil Oeste, 199, Centro de Passo Fundo.
Originalmente lançada nos Estados Unidos em 1982, a obra é o resultado de extensa pesquisa histórica e entrevistas com judeus ex-presidiários do campo de extermínio de Sobibor, na Polônia. O lugar entrou para a história por ser o cenário do mais bem-sucedido levante de prisioneiros num campo de extermínio nazista, em 1943.
O tradutor Felipe Cittolin Abal, professor de Direito na Universidade de Passo Fundo, propôs à Editora 8INVERSO a edição da obra, depois de realizar, por iniciativa própria, a tradução do original norte-americano, “Escape from Sobibor”. A história foi adaptada para um telefilme, em 1987, e o livro foi reeditado para o mercado americano em 1995.
“Fuga de Sobibor” apresenta ao grande público brasileiro relatos, fotos e documentos que ajudam a contar uma história emocionante e envolvente sobre liberdade, opressão e sobrevivência.
A entrada é gratuita; o livro estará à venda em ambos locais por R$ 56,00.
 
Serviço!
O QUE: Evento de lançamento e sessão de autógrafos do livro “Fuga de Sobibor”, de Richard Rashke, traduzido por Felipe Cittolin Abal.
QUANDO: 26 de agosto.
ONDE: No Centro de Lazer e Cultura Popular – Campus I da UPF (BR 285, bairro São José, em Passo Fundo, RS), às 15h. No mesmo dia, na Ramires – Revisteria e Livraria, Avenida Brasil Oeste, 199, Centro, em Passo Fundo, RS, das 18h às 20h.
QUANTO: Entrada gratuita.
 
Saiba mais!
Fuga de Sobibor, de Richard Rashke: primeira edição brasileira de importante resgate histórico sobre levante de prisioneiros judeus contra o campo de extermínio de Sobibor, na Polônia.
Tradução: Felipe Cittolin Abal
ISBN: 978-85-62696-12-1
Páginas: 384 pp.
Tamanho: 16cm X 23cm.
Preço de capa: R$ 56,00
 
Saiba mais!
Sobre a Editora 8INVERSO
Criada em 2009, em Porto Alegre, a 8INVERSO se destaca no mercado literário com edições elogiadas e títulos diferenciados. Seu primeiro lançamento foi a tradução de “Dostoievski – Correspondências (1838-1880)” que apresenta seleção de cartas do renomado escritor russo. Naquele ano, lançou também a biografia em quadrinhos do músico Johnny Cash, escrita pelo alemão Reinhard Kleist.
Em 2010, lançou “Histórias para quem gosta de contar histórias”, seleção de contos do Mestre em Filosofia e ensaísta Cássio Pantaleoni, e “Autobiografia de um ex-negro”, primeira tradução em português de um dos mais importantes títulos da literatura afro-americana, escrito por James Weldon Johnson. Em seguida, lançou outra biografia em quadrinhos: “Elvis”, sobre o Rei do Rock, também de Reinhard Kleist.
Em novembro de 2010, lançou seu primeiro livro infantil, “Por que o Elvis não latiu?”, com texto de Robertson Frizero e ilustração de Tayla Nicoletti. Em março de 2011, lançou sua terceira graphic novel biográfica de Reinhard Kleist: “Castro”, sobre o líder cubano Fidel Castro, e “Os regadores de livros” – segundo título infantil do catálogo, escrito por Juliana Dalla e ilustrado por Valéria Paes.
A 8INVERSO é a primeira editora gaúcha a comprar direitos autorais da Alemanha em seu primeiro ano de vida e a primeira a traduzir para o português os livros “Dostoievski – Correspondências (1838-1880)”, “Autobiografia de um ex-negro” e “Fuga de Sobibor”
www.8inverso.com.br
twitter.com/8INVERSO

agosto 06, 2011

35. Forastieri e quadrinhos

André Forastieri é um desses sujeitos que tem ideias interessantes e nenhum medo de espalhá-las em seu blog - em seu último post, ele sugeriu nada menos que a abolição das Forças Armadas brasileiras, seguindo o exemplo da Costa Rica. Inviável? Talvez. Um bom experimento mental, ainda mais quando ele nos lembra que deu certo na Costa Rica, que fica em uma das regiões mais bagunçadas do planeta? Sem dúvida. E as pessoas que mais merecem ser ouvidas não são aquelas com quem concordamos, mas aquelas que nos deixam com uma pulga atrás da orelha e nos fazem pensar um pouco.

Além de um blogueiro curioso, ele é um entendido em quadrinhos. Como sou leitor de quadrinhos desde que me conheço por gente e recentemente comecei a me interessar academicamente pelo assunto, tive a ideia de fazer um post para combater um pouco do preconceito que existe a respeito. Dizer que quadrinhos são um meio de expressão artística como qualquer outro, não são necessariamente para crianças e que, se a maior parte é dolorosamente ruim - como qualquer forma de arte - alguns são de grande qualidade literária.

Ia fazer isso, mas não fiz, porque Forastieri fez a mesma coisa antes: aqui, um texto que diz tudo isso e mais um pouco; aqui, comentários sobre uma dessas obras que merecem ser lidas: V de Vingança. Se você ainda não conhece, ou se só viu o filme, faça um favor a si mesmo e pare de se privar de coisas boas...