outubro 15, 2011

43. Arte paleolítica

 Um artigo interessante e bem ilustrado da Folha de ontem. Algumas notas no final:

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Arqueólogos acham mais antigo ateliê do mundo na África do Sul

RICARDO BONALUME NETO
DE SÃO PAULO

O mais antigo ateliê de pintura da Terra foi achado em uma caverna sul-africana. Os pintores de 100 mil anos atrás eram fãs de uma tinta ocre, com tons que variam entre vermelho, marrom e amarelo, armazenada em "paletas" feitas de conchas marinhas.
Os artistas primitivos usavam pigmentos de origem mineral e davam predileção a cores que, segundo as especulações dos pesquisadores, lembravam a vida cotidiana, seja pelo sangue das caçadas, seja pela fertilidade, ligada à menstruação no imaginário dos povos antigos.


Magnus Haaland/Associated Press
Vista do mar a partir do interior da caverna de Blombos
Vista do mar a partir do interior da caverna de Blombos

SEM FASE AZUL
Teriam entendido plenamente o "período rosa" de pinturas do espanhol Pablo Picasso (1881-1973), que durou de 1904 a 1906; não entenderiam, nem teriam como imitar, a "fase azul" anterior, por falta de pigmentos -ou talvez de interesse. Os pesquisadores associam a descoberta do antigo ateliê à própria evolução do pensamento humano.
Pintamos, logo pensamos. O ocre está disponível em óxidos de ferro, no solo, e pode servir tanto para pinturas murais quanto corporais. A "tinta" seria até um primitivo protetor solar para a pele.
"A capacidade conceitual de amostrar, combinar e armazenar substâncias que aperfeiçoam a tecnologia ou as práticas sociais representa um marco na evolução da cognição humana complexa", escreveram os pesquisadores na edição de hoje da revista americana "Science". A equipe, liderada por Christopher Henshilwood (professor da Universidade de Bergen, Noruega, e da Universidade de Witwatersrand, na África do Sul) encontrou o "ateliê" na caverna de Blombos, 300 km a leste da Cidade do Cabo. Francesco d'Errico, da Universidade de Bordeaux, na França, coordenou a datação do material encontrado por lá.
O ocre, as ferramentas de pedra para sua produção e as conchas foram achados já em 2008, mas desde então a equipe trabalhou para se certificar das datas.
A análise do interior das conchas, onde a "tinta" ocre era misturada, revelou traços do que poderia ser a ação de dedos humanos durante o processo de preparar o produto para o uso.
Os pesquisadores identificaram dois "kits de ferramentas" usados para a produção da tinta. Pela ausência de outros tipos de detritos comuns em cavernas habitadas por seres humanos nessa camada, como restos de animais, eles especulam que um grupo de pessoas esteve ali "por um dia ou dois, no máximo", diz Henshilwood.
A caverna, cuja habitação começou há 140 mil anos, tem se revelado um grande tesouro de achados ligados à evolução cultural humana.



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Talvez o leitor esteja pensando que a descoberta é interessante, mas sem saber muito bem o que a torna importante. A importância dessa caverna sul-africana está no fato de ela dar mais um golpe no modelo vigente da evolução humana recente - o da "revolução do paleolítico superior".

Explicando: segundo esse modelo, o ser humano anatomicamente moderno, fisicamente indistinguível de nós, surgiu na África há cerca de 200 mil anos atrás. Porém, até recentemente, não se conheciam evidências de comportamento culturalmente moderno - linguagem, pensamento simbólico, arte, qualquer dessas coisas que mostrasse uma capacidade de pensamento comparável à nossa - até aproximadamente 40 mil anos atrás, data das mais antigas estatuetas e arte rupestre europeias (como o gráfico do artigo mostra).
Então, diz o modelo, num primeiro momento surgiram seres humanos anatomicamente modernos, mas só muito mais tarde aconteceu alguma coisa que expandiu drasticamente sua capacidade mental - uma mutação que possibilitasse a linguagem, ou algo semelhante. Como o período iniciado há 40 mil anos é classificado como "paleolítico superior", essa súbita explosão criativa seria a revolução do paleolítico superior.
O pequeno problema - quase sempre existe um - é que, como a arqueologia se desenvolveu como ciência na Europa, é ali que haviam sido feitas a maior parte das buscas e escavações, enquanto o resto do mundo engatinhava nesse sentido até recentemente. Assim, era mais provável que se descobrissem sinais de comportamento moderno na Europa, que estava sendo escavada de um lado a outro, que em qualquer outro lugar, independentemente de onde esse comportamento realmente surgiu.
Nos últimos anos, as pesquisas na África tem mostrado que a arte é muitos milênios mais antiga do que se pensava. Tudo indica que a teoria de um desenvolvimento mental súbito vai por água abaixo, substituído por avanços graduais de longa antiguidade. Mas vão ser precisos vários novos achados como o de Blombos e muita discussão entre os arqueólogos para que se chegue a um novo consenso...















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