E quando nossos ex-presidentes se unem a favor do sigilo eterno de documentos públicos, alguém acredita que eles estão bem intencionados? Alguém acha boa ideia o governo poder esconder seus atos para sempre, especialmente um governo que cede a pressões tão descaradamente interesseiras?
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Sarney defende sigilo eterno de documentos para não ‘abrir feridas’
Eduardo Bresciani, do estadão.com.br
O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), defendeu nesta segunda-feira a manutenção do sigilo eterno sobre documentos considerados ultrassecretos. Em entrevista ao Estado, a nova ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, afirmou que o governo vai defender o sigilo eterno para atender ao desejo de ex-presidentes, como Sarney e Fernando Collor (PTB-AL), hoje senadores e integrantes da base aliada.
Na visão de Sarney, a abertura de documentos históricos pode “abrir feridas” do passado. “Os documentos históricos que fazem parte da nossa história diplomática, do Brasil, e que tenham articulações, como o Rio Branco teve que fazer muitas vezes, não podemos revelar esses documentos, senão vamos abrir feridas”.
Ele afirmou que é preciso manter o segredo para “preservar” o Brasil.
“Eu tenho muita preocupação que hoje nós tenhamos a oportunidade de abrir questões históricas que devem ser encerradas para frente no interesse nacional. Nós devemos olhar o Brasil. Ultimamente, todos nós nos acostumamos a bater um pouco no nosso país. Vamos amar o nosso país e preservar o que ele tem”.
Sarney nega, porém, que sua defesa do sigilo eterno tenha como objetivo ocultar ações suas quando presidiu o país. Ele afirmou que é preciso divulgar tudo que for relativo ao “passado recente”. “Sou um homem que nada tenho a esconder”.
Segundo a ministra de Relações Institucionais, o governo vai apoiar alterações no texto que tramita no Senado sobre a lei de acesso a informações. A proposta aprovada na Câmara prevê um limite de 50 anos para a manutenção do sigilo de documentos ultrassecretos. Ideli afirma que a intenção do governo é retornar ao projeto original enviado ainda pelo presidente Lula, no qual não havia limite para a renovação do prazo de sigilo dos documentos.
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Dilma cede a pressões e agora quer manter sigilo eterno de documentos
Ideli Salvatti disse ao ‘Estado’ que governo vai atender a reivindicações dos senadores e ex-presidentes José Sarney e Fernando Collor para facilitar tramitação do projeto no Senado
A presidente Dilma Rousseff vai patrocinar no Senado uma mudança no projeto que trata do acesso a informações públicas para manter a possibilidade de sigilo eterno para documentos oficiais. Segundo a nova ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, o governo vai se posicionar assim para atender a uma reivindicação dos ex-presidentes Fernando Collor (PTB-AL) e José Sarney (PMDB-AP), integrantes da base governista.A discussão sobre documentos sigilosos tem como base um projeto enviado ao Congresso pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2009. No ano passado, a Câmara aprovou o texto com uma mudança substancial: limitava a uma única vez a possibilidade de renovação do prazo de sigilo. Com isso, documentos classificados como ultrassecretos seriam divulgados em no máximo 50 anos. É essa limitação que se pretende derrubar agora.
"O que gera reações é uma emenda que foi incluída pela Câmara. Vamos recompor o projeto original porque nele não há nenhum ruído, nenhuma reação negativa", disse Ideli ao Estado.
Acatar a mudança defendida pelos ex-presidentes é a forma encontrada para resolver o tema, debatido com frequência no Senado desde o início do ano. O governo cogitou fazer um evento para marcar o fim do sigilo eterno - Dilma sancionaria a lei em 3 de maio, Dia Mundial da Liberdade de Imprensa.
Temerário
O desfecho não foi assim por resistência de Collor. Presidente da Comissão de Relações Exteriores, ele decidiu relatar a proposta e não deu encaminhamento ao tema. No dia 3 de maio, o ex-presidente foi ao plenário e mandou seu recado ao Planalto ao classificar de "temerário" aprovar o texto como estava. "Seria a inversão do processo de construção democrática."
Desde então, a votação vem sendo adiada repetidas vezes. Na semana passada, Dilma almoçou com a bancada do PTB no Senado. Na ocasião, Collor teria manifestado sua preocupação sobre o tema e exposto argumentos contrários ao fim do sigilo.
O senador Walter Pinheiro (PT-BA), que relatou o projeto na Comissão de Ciência, Tecnologia e Comunicação e é contra o sigilo eterno, vai procurar Ideli nesta semana para tratar do tema. "Estamos propondo acesso a informação de fatos históricos. Você vai abrir comissão da verdade para discutir o período da ditadura e não pode ter acesso às verdades históricas no Brasil?"
Atualmente, documentos classificados como ultrassecretos têm sigilo de 30 anos, mas esse prazo pode ser renovado por tempo indeterminado, o que ocorreu nos governos Lula e Fernando Henrique Cardoso.
Documentos da Guerra do Paraguai, terminada há 141 anos, continuam secretos até hoje. Se a nova lei for aprovada da forma como deseja agora Dilma, a única diferença é que a renovação do sigilo se daria a cada 25 anos.